23 de novembro de 2001

 

Depois de um dia muito cansativo (acordei às 4:50 e, desde então não parei), consegui chegar na chácara lá pelas 10 da noite. O céu estava meio nublado: tipo céu vaga-lume - entra nuvem, sai nuvem.Eu nem fiquei muito chateado, pois estava tão cansado que, em meu íntimo, já tinha deixado a minha primeira observação para a noite seguinte.

Mas São Pedro é um santo estranho... quando a gente desiste de tudo aí é que ele dá uma chance: de repente o céu limpou. Mas limpou mesmo. Nem uma nuvenzinha sequer. E, de quebra, apareceu aquele céu limpíssimo que só aparece depois de uma boa chuvarada.

Então não resisti: deixei o cansaço de lado e levei o meu novo telescópio para meu observatório (uma mesa colocada ao lado da piscina). Ajustei o buscador e resolvi que ia ser ambicioso na minha primeira observação: não ia olhar para aquela meia-lua que estava lá pedindo para ser observada:  virei para a constelação de Órion e mirei bem na M-42.

Lentamente ajustei o foco (que se revelou muito sensível: cada centésimo de milímetro já fazia uma enorme diferença), criei coragem e botei meu olho na ocular.

Meu coração deu um pulo.  E eu gritei como criança: CONSEGUIIIII !!!!!!!

Lá estava a M-42, perfeitinha. Igualzinha aos livros de Astronomia, com direito ao trapézio em seu interior - as 4 estrelinhas perfeitas - e a nebulosa muito bem definida.

Que emoção... Fiquei encantado com o que vi e feliz pois, afinal, o telescópio foi inteirinho construído por mim, baseado em informações incompletas e de difícil obtenção. Durante sua construção, muitas vezes tive de tomar decisões baseado apenas em meu próprio raciocínio, pois o "vide-bula" simplesmente não existia: eu tinha um projeto de um Newtoniano e, baseado nele tinha de fazer um Cassegrain. E deu certo. Foi uma deliciosa sensação de vitória.

Da M-42 parti para Júpiter. Que viajem... Lá estava o planeta com suas duas linhas diagonais perfeitamente visíveis e 4 de suas luas dando um show a parte. Fabuloso.

Só então me dignei a olhar para a Lua. Até mesmo com uma pontinha de raiva, afinal, se não fosse por sua luz incrível, eu teria tido a oportunidade de ver muitas outras estruturas do céu profundo.

Mas a Lua também deu seu espetáculo pela minha ocular: as crateras muito mais bem delimitadas; as montanhas e vales às quais dediquei tantas horas de observação no meu "velho" Tasco de 60 mm., agora tinha a terceira dimensão.

E uma luminosidade incrível. Chamei meu sogro para ver a Lua e a luz que saía da ocular em direção ao meu sogro iluminava completamente seu olho como se fosse uma lanterna que emitisse uma luz branca muito intensa.. E ele dizia: "olha só! Mas olha isso...".

Então, nosso amigo Pedrinho - São Pedro - resolveu que já era hora de acabar com a festa e me mandou uma nuvem enorme que encobriu totalmente o céu. No fundo foi bom, pois a coisa estava tão linda e emocionante que se não nublasse tudo, provavelmente eu iria passar a noite inteira olhando para o céu. E o orvalho ia escorrendo pelo tubo azul do telescópio. E meu pescoço doendo, devido à posição que eu era obrigado a ficar para ver os astros. Realmente, já era hora de dormir. E eu dormi. Feliz.

No dia seguinte me dediquei a adaptar o prisma do Tasco ao TPVA-1. Esta tarefa exigia uma nova colimação completa, pois o foco deveria ser mais distante do espelho secundário, o que me obrigava a trazer o secundário para mais perto do primário. A manobra levou praticamente o dia todo. Mas meu pescoço não iria agüentar mais uma noite sem prisma...

A qualidade da imagem com o prisma é levemente inferior àquela obtida diretamente da ocular. Mas as vértebras cervicais valem a leve perda de nitidez.

Cheguei à conclusão que este era mais um erro de projeto do TPVA-1: o tubo que suporta a ocular mede 10 cm. Se medisse entre 17 e 20, eu poderia usar tanto a ocular diretamente, como o prisma. Um pequeno grupo de neurônios sob a minha calota craniana (provavelmente situado bem embaixo daquela área que começa a ficar com poucos cabelos) tomou a decisão de comprar mais um pedacinho de cano de 32 mm para fazer a alteração, quando chegar em São Paulo.

Mas a noite foi decepcionante: havia um véu no céu que deixava tudo embaçado: as imagens eram pouco nítidas. Não havia comparação com as da noite anterior. Agradeci aos céus por ter resolvido estrear o telescópio na noite anterior, apesar do cansaço.

Interessante foi notar a diferença de posição das luas de Júpiter: na sexta-feira as 4 luas estavam bem alinhadas, todas do mesmo lado de Júpiter , formando uma diagonal quase perfeita com o planeta (à exceção de uma delas que estava ligeiramente fora do eixo): no sábado duas estavam praticamente coladas, de um lado do planeta e as outras duas, bem separadas, do lado oposto. Ou seja, elas andam rapidinho...

Me arrependi terrivelmente de não ter levado o computador para a chácara para poder fotografar estas imagens, mas na sexta-feira, na hora de arrumar as malas eu estava tão cansado que desisti de levar o micro.

Assim, caro leitor, perdoe não ter imagens para mostrar. Prometo que da próxima vez serei menos preguiçoso e levarei o computador comigo.

31 de novembro de 2001

Desde quarta-feira combinei com o Luiz Renato - a quem conheci na reunião do CASP (Clube Astronômico de São Paulo) à qual havíamos ido há uns meses atrás, que iríamos até sua casa em Jundiaí para ver as estrelas.

O Luiz Renato havia comprado há poucos dias seu novo telescópio: um Newtoniano de 180 mm. e, como eu, estava ansioso para testar o bicho. Desde quarta-feira eu ia consultando na Internet as previsões do tempo para ver se havia esperanças, mas tudo parecia indicar que só teríamos nuvens e chuvas...

Chegada a sexta-feira à noite, realmente só havia nuvens. Mas, parece que encontrei alguém tão teimoso e esperançoso quanto eu. Resolvemos ir assim mesmo. Quem sabe, chegando lá, o vento não daria um jeitinho...

Que nada! Nem um frestinha no céu! Mas é assim mesmo... A Astronomia tem dessas coisas. E a gente precisa arriscar, pois, às vezes, se têm surpresas. Você só sabe que aquela determinada noite o céu está excepcionalmente bom, se tentar.

Voltamos para São Paulo meio decepcionados.

 

2 de dezembro de 2001

O clima anda meio estranho... Está ventando um vento frio que lembra aqueles dias de final de outono. As janelas de casa balançam e fazem barulhos. A preguiça de sair de casa me deixa com duas opções: televisão ou computador. 

Visto que odeio a programação das nossas emissoras (com raras exceções, é claro), opto pela internet. E encontro um site de Astronomia muito bem elaborado: www.zenite.nu . E nele há uma parte dedicada às estrelas da nossa bandeira. Em resumo, a coisa é mais ou menos assim:

A cada criação de um novo estado, se acrescenta uma estrela à bandeira. Caso um estado seja eliminado, elimina-se também sua estrela correspondente da bandeira. As estrelas presentes na bandeira são algumas das que se podiam observar no céu de 15 de novembro de 1889, às 12 horas H.U (8 hs. e 37 min) - data da proclamação da República.

       

Interessante, não? Entretanto, imagino que haja havido um certo clima de disussão entre os governantes dos estados... Imaginou... Ah, porque a sua estrela é maior do que a minha?...

Bem, acho que o que realmente importa é que todas elas brilhem muito.